Antes tachada de vilã e vista com maus olhos por pais, médicos e educadores, as telas de telefones, tv’s, tablets e computadores passaram a ser, em tempos de Covid-19, grande aliadas da quarentena das famílias. E, para tranquilidade geral, “está tudo bem”, afirmam especialistas. 

As coisas andam fora da ordem, redundante dizer. Tudo sendo reavaliado e colocado em cheque em tempos de isolamento social e alastramento do coronavírus, sobretudo a educação – formal e informal – das crianças. Nesse cenário tão inédito quanto assustador, de mudanças e adaptações, o tempo de tela das crianças e adolescentes – antes tão veementemente atacado – também foi redefinido. Caiu em redenção e recebeu complacência de pais, pediatras e educadores. O jornal norte-americano Washington Post, no dia 9 de abril, inclusive, afirmou: “Tempo de tela: de pecado à ferramenta de sobrevivência” em um artigo defendendo a suspensão temporária da “screen shame” e a flexibilidade das horas gastas na frente das telas. “Devemos parar de ser cruéis com nos mesmos e reconhecer como as telas estão nos ajudando a sobreviver. Nesse momento extraordinário, isso é o que o médico mandou” afirma o Washington Post.

Assim, com aval dos profissionais de saúde e pedagogia, um dos grandes vilões da educação infantil recebeu – pelo menos temporariamente – o perdão. A razão é imaginável: “As telas estão servindo para um propósito, permitindo que continuemos nosso trabalho, nossa educação, nossa vida social” afirmou Randy Kulman – PHD., psicólogo infantil e autor de  “Train Your Brain for Success” and “Playing Smarter in a Digital World” – para o site Psychology Today

O que antes era visto como displicência parental e jogava as crianças usuárias em um temido futuro  (pesquisadores haviam relacionado o tempo excessivo de tela com depressão e obesidade) ganhou outro contorno. Mariana Martinato, administradora e mãe de Alice, de 5 anos, disse que “Agora, na quarentena, temos liberado mais o tempo de tela. Eu e meu marido estamos trabalhando de casa, então fica complicado. A primeira disponibilidade de tempo, a gente para e brinca com ela, mas baixamos aplicativos educacionais no Ipad dela e a tv tem ficado mais tempo ligada. Estamos no controle, mas deixando isso correr mais solto. Não tem outro jeito, a não ser que tenhamos o dia todo para nos dedicar a ela.”

Assim como a família Martinato, muitas famílias tem relaxado e sido mais condescendentes com as telas.  “A quarentena está ressignificando uma das grandes vilãs da tecnologia moderna: as telas. Agora os aparelhos são portais para o emprego e para a educação, formas de manter as pessoas em casa e construir comunidades, além de servirem como lembretes vitais de que não estamos sozinhos. As velhas preocupações já eram –  e parecem ser diferentes quando as pessoas estão apenas tentando viver um dia após o outro” afirmaram Andrew Przybylski (professor da University of Oxford) e Pete Etchell (autor de “Lost in a Good Game”) para o artigo Don’t Freak Out About Quarantine Screen Time, publicado no The New York Times.

Além de Przybylski e Etchell,  muitos especialistas estão revendo o “problema” do uso dos aparelhos e rejeitando a vergonha relacionada às telas. Recentemente, a Organização Mundial de Saúde oficialmente estimulou as pessoas a jogarem vídeo game como forma de fazer com que fiquem em casa;  o Center for Disease Control and Prevention dos Estados Unidos recomendou as pessoas a “telefonar, fazer vídeo chamadas, ou manterem-se conectadas usando mídias sociais” – recomendações bem diferentes das pré-quarentena.  Em 2006, por exemplo, a Sociedade Americana de Pediatria havia decretado que crianças entre 2 a 5 anos não deveriam ter mais  de uma hora de tela por dia. Em 2018, sob críticas e pressão de legisladores e até mesmo de investidores, a Apple e o Google incluíram controles de tempo aos seus softwares, teoricamente para estimular as pessoas a usarem menos seus aparelhos.  Hoje, a realidade é bem diferente e ninguém está preocupado em largar as telas – pelo menos até a pandemia passar e tudo voltar ao lugar. 

Confira as dicas que o psicólogo Randy Kulman dá para o uso das telas durante o confinamento de crianças e adolescentes:

  1. Segurança.  Manter a segurança da família é a sua missão mais importante. Mike Brooks, co-autor do livro Tech Generation pede aos pais que atendam às necessidades básicas das crianças: comida, água, sono e saúde. Crianças também precisam de amigos, exercícios, atividades e tempo para brincar. A maioria das atividades em grupo não podem ser realizadas com a distância social, e os jovens podem ficar entediados em casa. Se você precisar mudar as regras de tempo de tela em casa para que eles não fiquem tentados a sair, considere-o. Lembre-se: adolescentes pensam que são invulneráveis e agem antes de pensar. 
  2. Diminua a ansiedade exagerada causada pelas telas. Mantenha as crianças (especialmente as menores de 12 anos ) longe das notícias ao vivo, em que as casualidades da pandemia estão à mostra. Se jogar vídeo game mantém a mente da criança longe de pensamentos amedrontadores, permita mais isso – mas também mantendo jogos e filmes assustadores longe. 
  3. Aumente as atividades saudáveis, não apenas o tempo de tela. Crianças e adultos têm mais tempo para recreação na quarentena. Esse é o momento perfeito para adquirir um exercício regular, praticar yoga ou meditação. Sabe-se que, normalmente, se leva de 30 a 66 dias para incorporar um novo hábito saudável. 
  4. Mantenha a sanidade da sua família. Dar-se bem, reduzir conflitos e manter-se ocupados são essenciais para a saúde mental de sua família. Às vezes, tanto crianças quanto adultos precisam de seu próprio espaço – mesmo que esse espaço seja diante de uma tela. No entanto, não perca o controle do tempo de tela das crianças menores.  Não elimine as regras e expectativas – inclusive com os adolescentes. 
  5. Dê exemplo de carinho, preocupação, comunicação e afeto no tempo que você fica diante das telas. Se os pais usam os aparelhos para falar com seus amigos e checar se a família está bem, ou comunicar-se com colegas de trabalho,  as crianças irão observar isso e ver que as telas podem conectar as pessoas. Jogue-se no sofá com seu marido, esposa, filhos e aproveite a diversão da tela em família. Encontre algo que todos gostam e isso pode render uma boa conversa familiar.

Fonte:  https://www.psychologytoday.com

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