Especialistas recomendam que pais diminuam a carga de atividades das crianças e criem momentos de pausa, silêncio e a meditação, cujos benefícios podem ser tão – ou mais – importantes que as atividades escolares e extra curriculares para seus filhos nesse momento

Diretamente impactadas pelo confinamento social, as crianças foram drasticamente tiradas da rotina planejada das escolas para cair na agenda – às vezes não tão estruturada – do homeschooling. Pais e mães que não estavam acostumados a ter os pequenos em casa o dia inteiro tiveram que criar atividades que, além de abordarem o conteúdo formal curricular, mantivessem seus filhos entretidos e motivados mesmo durante a quarentena. No entanto, o que se viu, em alguns casos, foi um aumento no número de crianças e pais ansiosos por não cumprirem, muitas vezes, a agenda do dia. 

Para Fernanda Fank, terapeuta Integrativa de Abordagem Sistêmica e Hipnose Clínica e pós-graduanda em Neurociências do Desenvolvimento e da Cognição,  Práticas de Meditação e Psicanálise, “Talvez alguns pais, na angústia por preencherem as lacunas deixadas pelo convívio social na vida dos filhos, tenham se excedido. A ansiedade em suprir às demandas do ensino à distância também pode estar refletindo em uma sobrecarga de atividades. Fato é que, independentemente do momento e da idade, qualquer pessoa pode sucumbir ao excesso de obrigações”. Por isso, segundo ela, as pausas e a meditação – prática milenar que comprovadamente reduz os níveis de stress do indivíduo –  podem ajudar tanto as crianças quanto os pais a reduzirem a ansiedade trazida pela pandemia e pelo confinamento. De acordo com a psicobióloga Elisa Kozasa, do Instituto do Cérebro do Hospital Israelita Albert Einstein e que realizou uma das pesquisas mais importantes sobre o assunto,  “O cérebro de pessoas que meditam recruta menos áreas cerebrais para realizar uma determinada tarefa, como se fizesse uma maior ‘economia’, o que se traduz em mais foco e concentração. Um desafio no mundo cheio de estímulos em que vivemos”. Ainda, de acordo com O The British Journal of Psychiatry, que avaliou mais de 500 adolescentes entre 12 e 16 anos que participavam de programas de meditação,  os jovens declararam maior bem-estar físico e apresentaram menos sintomas depressivos e baixos níveis de estresse em comparação ao grupo de controle.

Confira, a seguir, a entrevista com Fernanda Fank sobre a importância da meditação, da pausa e do silêncio para a saúde mental de pais e filhos. 

1) Quais as consequências de uma rotina muito atribulada – e estressante-  para os pais e para as crianças?

A liberação excessiva de hormônios estressores na corrente sanguínea, como é o caso do cortisol, aumenta o risco de doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão, depressão e obesidade. Em crianças, a situação se agrava, uma vez que, com o cérebro ainda em desenvolvimento, ela está neurologicamente imatura para desempenhar tantas funções. 

Há, ainda, estudos que mostram que o estresse pode prejudicar especificamente o córtex pré-frontal, área responsável pelas funções cognitivas, memória de trabalho e tomada de decisões. Ser cobrada por tantas responsabilidades pode também resultar em sentimentos de frustração, insuficiência, incapacidade e ansiedade de desempenho.

 

2)  Qual a importância da criança ter momentos de pausa no dia? 

Os intervalos são importantes para o processo de aprendizagem, pois grande parte da atividade cerebral se dá em ciclos. Alternamos a todo o momento entre foco e desatenção. Manter um ritmo que intercale as tarefas a pequenas pausas otimiza a produtividade. Além disso, as pausas permitem que a criança se revigore e evitam o esgotamento. 

 

3) E os benefícios do silêncio? 

O barulho é um agente estressor e pode causar malefícios à saúde. A ciência já se ocupou de estudar os danos relativos à poluição sonora e comprovou que além da perda auditiva, os ruídos excessivos elevam as taxas de cortisol. O silêncio, por outro lado, reduz o estresse, aumenta a capacidade de concentração, reflexão, aprendizado e memória. Para quem tem uma rotina atribulada e barulhenta, silenciar pode ser uma experiência impactante e transformadora de voltar-se para dentro, escutar as vozes internas, os batimentos cardíacos, ouvir-se.

 

4) Como os pais podem criar momentos de pausa e relaxamento para as crianças?

Uma vez ao dia, os pais podem criar um ambiente silencioso ou com uma música instrumental, sentar ou deitar sobre almofadas e conduzir a criança a focar em sua respiração, sentindo o ar entrando e saindo das narinas, com uma mão em cima do peito e a outra na barriga. Pode estabelecer uma contagem, por exemplo: inspira 1, 2, 3…. expira 3, 2, 1…  Pode-se, ainda, apenas dizer as palavras: inspirando… expirando nos pés, inspirando… expirando nas pernas, inspirando… expirando na barriga, para cada parte do corpo até chegar à cabeça. Esta técnica simples, promove a diminuição do ritmo respiratório, o que inibe a produção de hormônios como a adrenalina e o cortisol, secretados em situações de estresse. Mas, antes de tudo, acho que o que mais ajuda neste momento é não se cobrar tanto, dado que este é um momento atípico.

 

Como meditar com seu filho

Muitos profissionais, escolas e até aplicativos podem te ajudar na tarefa de acalmar a mente da criança e criar bons momentos de reflexão e relaxamento. No entanto, para começar, Fernanda recomenda alguns passos bem simples. Experimente:

– Coloque uma música instrumental suave.

– Sente-se ou deite-se confortavelmente.

– Diga para a criança colocar a mão ou um ursinho de pelúcia em cima do umbigo e peça para que preste a atenção no movimento que a barriga faz enquanto respira.

– Peça para que ela visualize um balão colorido dentro da barriga. Ele enche de ar enquanto inspiramos e esvazia ao expirarmos.

– Agora ela pode fechar os olhos e fazer uma ou duas respirações completas prestando a atenção em cada área do corpo: pés, pernas, abdômen, peito, costas, mãos, braços, ombros, pescoço e cabeça. 

– Para finalizar, diga para que, aos poucos vá prestando atenção ao ambiente, sentido a superfície sob a qual está sentada ou deitada e, por fim, peça para que abra os olhos e se alongue ou espreguice vagarosamente. Uma opção é, antes de finalizar, dizer uma palavra que desperte uma qualidade positiva e permanecer por mais uns minutos mentalizando-a por exemplo: paz, alegria, confiança, tranquilidade, amor, gratidão.

O ideal é que a prática demore de 5 a 10 minutos – o suficiente para as crianças se acostumarem a sentir os efeitos do exercício, descobrindo que “fazer nada” pode ser tão divertido quanto brincar. 

 

Para aprender e praticar mais 

Com uma boa pesquisa, muito material e referência sobre meditação e mindfulness pode ser encontrado na internet. Uma boa fonte é a Mindful Schools, uma organização sem fins lucrativos que está oferecendo aulas gratuitas de mindfulness, que “focam no momento presente e explora nossos pensamentos, emoções sensações corporais com uma mente aberta e curiosa.  Com base em pesquisas científicas, as práticas de mindfulness podem ajudar na melhoria do controle das emoções, no foco e no alívio do stress.” As aulas são gratuitas, mas você deve registrar-se para participar. 

O aplicativo Headspace também criou uma área que oferece orientações de como pais podem ter conversas com seus filhos sobre stress, ansiedade e como reagirmos melhor e sermos mais empáticos uns com os outros nesses tempos de tanto medo e incerteza. O aplicativo também oferece meditação gratuita.


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