A alimentação vegana, que é uma dieta estritamente à base de vegetais, sem o consumo de quaisquer alimentos de origem animal, tem conquistado cada vez mais adeptos. Certamente você conhece ao menos uma família toda que adotou esse estilo de vida, não é mesmo? E é exatamente com esse cenário que muitos têm questionado o veganismo na infância. Afinal, criança também pode ser vegana? Há riscos para a saúde e o desenvolvimento infantil?

De acordo com a nutricionista Clarissa Casale Doimo, que é especialista em Nutrição Vegetariana pela Sociedade Vegetariana em parceria com A Plenitude, crianças podem, sim, ser veganas. “Não há nenhum risco se a família souber como oferecer a alimentação e tiver auxílio quanto a suplementação de vitamina B12, que é o único nutriente não encontrado na alimentação baseada em vegetais”, explica a profissional.

Clarissa afirma que, segundo a Academy of Nutrition and Dietetics (antiga ADA) e o Conselho Regional de Nutrição da 3ª Região (CRN-3), a alimentação vegetariana pode ser seguida em todos os ciclos de vida, inclusive na gestação, durante lactação e na infância. 

“O parecer da ADA considera ainda que a dieta vegetariana, apropriadamente planejada e com boa fonte de vitamina B12, é saudável, nutricionalmente adequada e promove benefícios à saúde, prevenindo doenças. Vale ressaltar que, com qualquer dieta ou alimentação, o acompanhamento profissional é sempre bem-vindo”, pontua.

A nutricionista ainda ressalta que a frequência de exames e consultas médicas de uma criança vegetariana deve ser igual a de uma criança que segue uma alimentação onívora.

Quais os benefícios de uma alimentação vegana? 

Você sabia que a alimentação vegana é uma aliada na prevenção, e até tratamento, de doenças crônicas inflamatórias, como infarto, diabetes, doenças renais, doenças intestinais, doenças no coração, diversos tipos de câncer e obesidade?

Segundo a nutricionista Clarissa Casale Doimo, a alimentação baseada em vegetais é rica em antioxidantes, substâncias anti-inflamatórias que previnem diversos tipos de doenças. “Além disso, a dieta baseada em vegetais fornece menor quantidade de gordura saturada, gordura considerada pró-inflamatória e grande contribuinte para a origem das diversas doenças crônicas citadas”, explica.

Como deve ser a dieta de uma criança vegana?

Você tem vontade de adotar a alimentação vegana, mas por ter criança em casa, fica com dúvida de como será a dieta do seu filho e/ou filha? A nutricionista Clarissa Casale Doimo, que é especialista em Nutrição Vegetariana, é enfática ao afirmar que o cardápio será parecido com a dieta da criança onívora.

“Terá a exclusão do grupo das carnes (e ovos, se a família também optar), e aumentará a oferta das leguminosas (alimentos ricos em ferro e proteínas: como feijões, lentilha, ervilha e grão de bico). Essa seria a principal diferença, pois os outros grupos alimentares vegetais também precisam estar presentes na alimentação de uma criança onívora”, pontua.

Para exemplificar, Clarissa explica que a medida que uma criança onívora almoçaria uma porção de carne, feijão, arroz, legumes coloridos e folhas, a criança vegetariana apenas não consumiria o grupo da carne e aumentaria a quantidade do feijão, que é a leguminosa. 

“As leguminosas devem ser oferecidas em duas porções ao dia nas refeições principais. Também não é necessário oferecer mais que uma variedade desse grupo ao dia. As leguminosas devem ficar imersas em água limpa por pelo menos 12 horas antes do cozimento para que os compostos antinutricionais (como o ácido fítico) sejam diminuídos, melhorando a absorção de nutrientes e a digestibilidade do alimento. Após esse processo, cozinhar com água e temperos”, orienta.

Ainda de acordo com a nutricionista, no grupo dos cereais, raízes e grãos podem ser inclusos as batatas, arroz integral, quinoa, milho, mandioca, cará, inhame, trigo (macarrão integral), amaranto, cevada e aveia em flocos. “Legumes, hortaliças e verduras devem ser oferecidos nas duas refeições principais. Todos podem ser oferecidos frequentemente, exceto o espinafre e a acelga, pois são ricos em ácido oxálico, que é o inibidor mais potente da absorção de cálcio”, recomenda. 

Já os vegetais que apresentam coloração alaranjada, como cenoura, abóbora e batata doce, Clarissa afirma que devem ser oferecidos três vezes na semana para atingir a necessidade de betacaroteno. “Alimentos verdes-escuros que são fontes de cálcio, como o agrião, brócolis e couve devem ser oferecidos pelo menos quatro vezes na semana”, completa.

Outra dica da profissional é oferecer junto à refeição principal frutas com maior teor de vitamina C, como laranja, acerola, abacaxi, morango e goiaba, pois auxiliam na absorção do ferro.

O que fazer quando a família não é vegana e a criança recusa a ingestão de carnes?

Se esse for o seu caso, saiba que não há motivo de desespero. Quando a criança recusa a ingestão de alimentos de origem animal, mas os pais ainda não são adeptos ao veganismo, a família precisa se reeducar e conhecer sobre educação nutricional vegetariana.

A nutricionista Clarissa Casale Doimo adianta que as principais informações estão disponíveis gratuitamente no site da Sociedade Vegetariana Brasileira, onde é possível baixar o “Guia Alimentar para Bebês e Crianças Vegetarianas” neste link

“Além disso, a família pode procurar um profissional médico/nutricionista que esteja atualizado no acompanhamento de pessoas vegetarianas e veganas, para obter mais informações sobre necessidade de suplementação de vitaminas e minerais e adequação de cardápio, caso eles estejam tendo muitas dificuldades”, afirma.

Clarissa lembra ainda que a dieta vegana já se mostrou saudável e preventiva para diversas doenças. Portanto, se a criança desejar seguir esse tipo de alimentação, a família precisa apoiar com orientações e atenção. 

Mãe compartilha vivência do filho com o vegetarianismo estrito

A administradora Caroline de Cássia Monteiro, de 42 anos, que atua como funcionária pública no Rio Grande do Sul, é mãe de Benício, de 8 anos. A família é adepta ao vegetarianismo estrito. “Preferimos o termo vegetarianismo estrito, visto que o veganismo é para ser usado quando não usamos nada de origem animal, testado/utilizado em animais. Como não temos acesso a toda a cadeia produtiva, de tudo que usamos/consumimos, não podemos nos considerar veganos absolutos. Como é o caso das vacinas, por exemplo, das quais somos a favor, mas que infelizmente são testadas em animais”, explica.

Caroline conta que, inicialmente, a família adotou uma dieta livre de carnes, tanto por não apreciarem consumir esse item, mas também por questões relacionadas com a saúde e meio ambiente. Nessa época, derivados do leite, como queijos e iogurtes, ainda faziam parte do cardápio.

Porém, ainda bebê, Benício foi diagnostico com asma, o que levou Caroline a estudar sobre alergias alimentares e ambientais. E, durante a pandemia, eles optaram por abolir queijos e iogurtes. “No início da pandemia, em casa e consumindo muito Netflix, nos deparamos com dois documentários, o ‘Cowspiracy: O Segredo da Sustentabilidade’ e o ‘What the Health’. Eles foram a girada da chave que nos faltava para aderir a uma dieta vegetariana estrita, pois nos defrontamos com uma realidade que, digamos, não queríamos enxergar”, destaca.

Segundo Caroline, o filho faz a rotina de exames de sangue junto ao pediatra, que não apoia a dieta adotada pela família. “Mas, frente à boa saúde do Benício, não nos contesta. Até o momento, ele não teve anemias ou outras deficiências. Os vegetarianos estritos e veganos devem suplementar B12, que deve ser diária e personalizada. Até então, quem cuidava dessa questão era o pediatra. Mas, esse ano, passamos a ter acompanhamento de nutricionista vegana”, pontua.

Confira como é a rotina alimentar do Benício, uma criança que segue o vegetarianismo estrito

A administradora Caroline de Cássia Monteiro, de 42 anos, compartilhou como é a rotina alimentar do filho, de 8 anos:

Café da manhã: 

– Vitamina à base de banana com leite de coco ou chocolate quente preparado com cacau em pó e leite de coco.
– Pão (sem ovos e/ou leite de origem animal).

Lanche da manhã:

– Frutas, sendo as preferidas laranja, melão, maçã e banana.

Almoço:

– Grãos: feijão, dos mais variados tipos, e/ou lentilha;
– Salada: prefere brócolis, beterraba, tomate e couve-flor;
– Porção de arroz, ou batata, ou milho. Sempre que possível, integral;
– Porção de hortaliças, como cenouras, mandioca e abóbora;
– Às vezes, Benício pede bife de soja, que por ser industrializado, não faz parte da rotina diária alimentar da família;
– Sobremesa: frutas com regularidade, sobretudo laranja, tangerina ou kiwi, suas preferidas no momento.

Lanche da tarde:

– Sucos de frutas naturais, castanhas, biscoito ou bolos integrais e, se possível orgânicos (livre de produtos animais), chips assados, pipoca, poupa de frutas orgânicas, etc.

Jantar:

– Dieta semelhante ao cardápio do almoço. No inverno, optam por aproveitar a sobra dos feijões e demais alimentos do almoço, reforçando com alguma hortaliça fresca ou macarrão integral, e preparam sopas.;
– Às vezes pede um suco ou fruta após o jantar;
– Nas sobremesas dos fins de semana, a família opta por doces com chocolate 85%, que apesar do sabor forte, Benício gosta e mãe prepara mousse de cacau e abacate.

“Esse seria um exemplo básico da alimentação do meu filho. Por vezes, experimentamos uma receita nova envolvendo queijos veganos, tofus, pizzas veganas, brigadeiro vegano, entre outras delícias que a culinária vegana vem nos apresentando”, afirma Caroline.

*O almoço e o jantar são acrescentados uma colher de sobremesa de azeite de oliva.


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