Basta a criança se recusar a acenar para o vizinho ou tentar se esconder entre as pernas dos pais quando algum conhecido se aproxima para que ela ganhe o rótulo de tímida. Mas será mesmo que essas atitudes são um problema? Esses comportamentos realmente são características de timidez?
Para a psicóloga Carla Poppa, que é doutora em desenvolvimento e psicoterapia de crianças, trata-se apenas de sinais de constrangimento bens comuns na infância. De acordo com a profissional, a partir dos 3 anos as crianças passam a ter a consciência de que são pessoas únicas. “A partir dessa consciência, a criança consegue perceber quando as outras pessoas estão lhe observando, fazendo comentários ou criando expectativas sobre o seu comportamento, o que pode fazer com que ela se sinta constrangida. O constrangimento é, então, uma sensação que a criança só começa a experimentar quando já tem uma consciência de si mesma e é uma reação natural a situações nas quais se sente exposta”, explica.
Sendo assim, quando os pequenos se sentem constrangidos, eles expressam essa sensação de maneira espontânea, evitando olhar para as pessoas, escondendo o rosto ou se escondendo atrás dos pais, por exemplo. “Estas são reações naturais que revelam a intenção de buscar alguma proteção para a exposição provocada pelo olhar ou comentário dos outros”, ressalta.
Carla lembra que os adultos também que a sensação de constrangimento também é comum aos adultos em muitas situações, porém, a diferença é que possuem maturidade para disfarçar e conseguem controlar a forma de expressar esse sentimento. Entretanto, mesmo “sentindo na pele” muitas vezes essa sensação, eles acabam depositando expectativas nos filhos, acreditando que os baixinhos já são capazes de lidar com o desconforto, esquecendo que as crianças estão começando a experimentar o constrangimento.
“Quando existe essa expectativa, é comum que os pais critiquem a criança ou forcem o contato com a pessoa que a criança está evitando – comportamentos devem ser evitados, pois só vão intensificar o constrangimento da criança. O ideal é respeitar o desconforto da criança pois, com o tempo, é bem possível que ela consiga controlar essa sensação naturalmente”, orienta.
E quando o constrangimento nunca passa?
Agora, se a criança for crescendo e ela ainda mantiver esse comportamento, o ideal é que os pais conversem sobre autocontrole e expliquem que todos ficam constrangidos e desconfortáveis em algum momento. “Esta fala confirma a sensação da criança e faz com que ela se sinta compreendida. Ao se sentir compreendida, ela fica aberta para ouvir e assimilar a orientação dos seus pais que podem, então, explicar que mesmo ela sentindo vontade de fugir ou se esconder, é capaz de se controlar e agir de outra maneira, como acenar para a pessoa e manter um sorriso, por exemplo. Esta orientação funciona como uma referência para a criança de como agir no contato com o constrangimento e, aos poucos, ela mesma vai conseguir escolher outras maneiras de agir nessas situações”, completa.
Não esqueça que o constrangimento é algo natural, passageiro e saudável. Afinal, é uma maneira de aprender sobre respeitar o próprio limite, o do outro e que, às vezes, precisamos nos ajustar em determinas situações.
E quando é mesmo timidez: o que fazer?
Se por um lado o constrangimento é algo passageiro, já a timidez é uma característica permanente. Nesse caso, a criança costuma se mostrar mais retraída e tende ao isolamento. “Ela sofre com uma autocrítica exagerada, que inibe a sua espontaneidade. E, com o tempo, a criança tímida pode assimilar a crença de que é uma pessoa diferente e inadequada”, explica a psicóloga Carla Poppa
Se você já notou essas características no seu filho (a), é importante ajudá-lo (a). Porém, saiba que incentivar a criança a deixar a timidez de lado nem sempre é o melhor caminho. “A criança tímida já é muito autocrítica e pode entender esses incentivos como uma crítica ao seu comportamento, o que vai intensificar seu sofrimento”, afirma.
Segundo a profissional, é necessário refletir sobre quais características das relações familiares podem ter contribuído para que a criança tenha se retraído ou tenha até mesmo assimilado a crença de que se comporta de maneira inadequada.
“Na maioria das vezes, castigos que são colocados de maneira desproporcionais ou pais que ficam muito ofendidos com as atitudes da criança, ao invés de entender que os erros da criança são uma oportunidade de aprendizagem, contribuem para que ela entenda que é inadequada e a retração do seu comportamento se torna uma reação natural de defesa diante do medo que ela sente das consequências que a sua espontaneidade pode provocar”, pontua.
Desta forma, ao notar que a timidez persiste conforme seu pequeno (a) vá ficando mais velho, é recomendado procurar ajuda psicológica, pois existe risco dele estar sofrendo ou ter o desenvolvimento prejudicado.
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“Vejo que tem um sofrimento atrás da timidez”, desabafa mãe
A designer Analina*, de 37 anos, é mãe de uma garotinha de 3. Há cerca de um ano, Analina começou a notar um comportamento diferente na filha. “Com aproximadamente 2 anos, começamos a perceber que ela se escondia atrás da gente e escondia a cabeça no colo. Eu me preocupo, porque vejo que tem um sofrimento atrás dessa timidez”, desabafa.
Devido à frequência nas atitudes demonstradas pela criança, Analina acredita que não seja apenas constrangimento, mas propriamente uma timidez. “Não precisa ter contato, basta uma aproximação e ela já se esconde. Acredito que constrangimento seria se a outra pessoa falasse com ela algo que a deixasse constrangida, mas a maioria das vezes não tem esse contato. Já nas apresentações da escola acredito em constrangimento. Ela ama dançar, vejo que tem vontade, mas na hora ‘H’ não consegue”, narra.
Para ajudar a filha, a designer conversou com a equipe docente da escola onde a pequena estuda e, juntas, preferiram aguardar e seguir observando a criança, antes de procurar ajuda psicológica.
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